para começar a semana, semana em que lançarei meu disco duplo folhas_fruto, decidi entrevistar a júlia rocha. júlia acompanhou desde o início, antes ainda, a produção deste trabalho. ela e o lírio sabem, inclusive, mais do que eu sobre este lançamento. por esta razão são eles (e um antúrio) a capa do primeiro disco (não lançarei os dois juntos, amanhã explico melhor), uma foto de helena wolfenson, registro feito na véspera do parto, design de maikon nery.
deixo aqui a entrevista sem minhas perguntas. o que interessa mesmo são as palavras da rocha.
um
nossa língua me fascina por suas infinitas possibilidades. as folhas do galo, ainda que se refiram ao múltiplo verde da mantiqueira, são também as folhas do caderno onde ele mantém o costume de escrever à mão. e estas, por sua vez, já foram outras folhas, folhas quando árvore. mas não posso deixar de lembrar das folhas de alface verdíssimas que plantamos com nosso amigo robson num canteiro circular. no canteiro, uma espécie de mandala, nasceram alfaces exuberantes, de um verde quase neon. as folhas vão se transformando a cada estação. durante o período de composição e gravação do disco, a paisagem toda mudou. as folhas do galo são poemas que são som, canção.
dois
a autoria se dilui quando estamos juntos assim. nesse um ano e um mês do lírio somos três. todas as definições partem dos três ritmos, mas com certeza o do lírio em primeiro lugar. como temos uma vida em parceria, nosso dia a dia em casa, nosso trabalho de criação, cada detalhe compõe. o galo ouviu não só as plantas do lado de fora mas também nosso filho ainda dentro da minha barriga. talvez ele tenha colocado em canção alguns pensamentos meus também. até porque, nas suas canções, dentro e fora são ligados como uma fita de moebius. o “interior” do qual ele fala em uma canção pode ser geográfico, o interior do mato como a música do dominguinhos e do gil, mas o interior também é o interior do corpo.
três
a folha que mais tem convivido com a gente é a paciência. o tempo dilatado na espera do rebento, a reviravolta que traz a chegada de uma criança. o tempo das plantas, das folhas, nos ensina a olhar e esperar. temos convivido com folhas e elas nunca estão sozinhas. por exemplo, a helicônia recebe visitas constantes de um beija-flor. o beija- flor toma água na helicônia e provavelmente a ajuda a procriar. mirra jasmin rosa bananeira cúrcuma bálsamo limão cravo amora camarão citronela impatiens (que galo chama de spaten, como a cerveja) têm sido nossas companheiras. aqui em casa tudo fica muito próximo, flores plantas folhas filho…
belezuras folhosas!
a parte do interior/interiores me lembrou o poema da regina azevedo:
minha mãe veio do interior
da minha vó
vovó veio do interior
do interior do caicó
eu vim do interior
do interior
da minha vó